CHORO NO BREGA
Morre Dona Cabeluda. Enterro da maior cafetina da Bahia comove baianos. Por Antonio Mello/ Forum
Cabeluda
poderia dizer com propriedade que a vida dela daria um romance, e não estaria
exagerando se acrescentasse: de Jorge Amado
O nome dela
é Renildes Alcântara dos Santos, mas pelo seu nome oficial ninguém a
conhece em Cachoeira nem em todo o Recôncavo ou na Bahia.
Aliás,
Renildes sempre fez questão de esconder seu nome verdadeiro. Preferia ser
chamada pelo apelido que lhe deram e a tornou famosa: Cabeluda, por ter muitos
pelos no corpo.
Cabeluda
parece personagem extraída de um romance de Jorge Amado. Sua história de vida é um
romance de Amado não escrito, mas vivido.
Obrigada
pela família a se casar aos 13 anos com um homem muito mais velho, Renildes
aguentou o quanto pôde. Mas, aos 20 anos, fugiu e foi parar, por uma dessas
coincidências da vida, na terra natal de Jorge Amado, Itabuna (BA).
Sozinha,
Renildes teve que se virar como podia, inclusive fazendo aquilo que você está
pensando, a prostituição. De lá foi para Feira de Santana, até que chegou a
Cachoeira, cidade onde ficou até morrer na segunda passada, dia 6. Foi em
Cachoeira que Renildes passou a ser "Cabeluda".
Lá, começou
trabalhando num "brega", um termo regional no
Nordeste que significa boate, casa noturna ou de prostituição. Logo, montou o
seu, o "Brega da Cabeluda", o mais famoso do Recôncavo Baiano.
Tão famoso
que levou uma natural de Cachoeira, Gleysa Teixeira Siqueira, a defender
uma tese de mestrado sobre ela, "Uma História de Cabeluda: Mulher,
Mãe e Cafetina".
Melhor, a
tese foi defendida não na UFRB (Universidade Federal do Recôncavo Baiano),
mas no próprio Brega da Cabeluda.
A história
da “última cafetina” de Cachoeira, no Recôncavo, levou pesquisadores e até quem
nunca tinha frequentado “uma casa de tolerância” a entrar no “Brega de
Cabeluda”, como é conhecida a casa de número 12 na Rua Sete de Setembro.
Foi na
terça-feira, 5 de julho de 2017, e o motivo era a defesa da dissertação de
mestrado de Gleysa Teixeira. Formada em história pela UFRB e agora mestre em
ciências sociais, a pesquisadora decidiu contar sobre uma das lendas vivas da
cidade.
“Minha ideia era dar visibilidade à história de Cabeluda, que faz parte
dessas mulheres estigmatizadas, marginalizadas e excluídas. Ela conseguiu
sobreviver e se manter e, apesar do patriarcado, fez um nome na sociedade. Ela
é praticamente uma lenda viva da cidade”.
Para Gleysa,
o fato de apresentar o trabalho no “brega” também serviu para desconstruir e
tirar o véu negativo do lugar.
“Na minha infância ouvi muito as pessoas falarem, ‘ah, mulher direita
não pode andar na rua do brega’, e muita gente não passava mesmo. Eu sei que
existem questões atuais que envolvem crimes em alguns lugares. Mas a gente
também tem que quebrar estas visões estereotipadas. Porque o exemplo de
Cabeluda é de empoderamento. Não há relato de que ela explorava as mulheres”,
argumenta. [Bahia Notícias]
Diferentemente de outras cafetinas, Cabeluda nunca agenciou ou cobrou agenciamento das prostitutas do local. Cobrava apenas pelo aluguel do quarto.
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